Em entrevista ao Portal D24AM, a ministra do Superior Tribunal de Justiça Eliana Calmon falou sobre a posição das mulheres no Judiciário brasileiro, criação de novos tribunais, as atuações do Conselho Nacional de Justiça e do STJ.
Como a senhora vê a importância da participação das mulheres no Judiciário?
As mulheres têm avançado muito na questão do empoderamento das mais diversas áreas de Poder. Entretanto, no Poder Judiciário estamos a precisar de mulheres mais participativas na questão de gênero.
Em junho deste ano movimentos populares foram às ruas em todo o País. Os principais alvos foram o Legislativo e o Executivo, a senhora acha que o Judiciário está distante da população ao ponto de ser esquecido?
O Poder Judiciário foi esquecido temporariamente por circunstância pontual: o julgamento dos mensaleiros ou a Ação Penal 470, bem como pela atuação do ministro Joaquim Barbosa. Não fossem estes dois pontos, estaríamos também sendo alvo de protestos.
O Legislativo aprova os recursos para os poderes. Para os tribunais de Justiça nos Estados cria-se, por isso, um risco de interferência entre poderes?
Não acho que seja risco. O Judiciário tem uma participação fixa em termos percentuais sobre as receitas do Estado, de forma a ter assim independência, não ficando a reboque de nenhum dos Poderes. Ocorre que os orçamentos são as vezes camuflados de tal forma que os duodécimos de participação restam insatisfatórios para atender às necessidades do Judiciário. Por outro lado, o que se arrecada de custas e emolumentos muitas vezes não vai para o Judiciário, pois o STF, examinando a querela disse que cada Estado faria sua lei estabelecendo o repasse. É o caso da Justiça Estadual do Rio de Janeiro.
A criação dos novos tribunais regionais federais é um ônus desnecessário ou uma necessidade para a população?
Tenho opinião formada após atenta observação e depois de 20 anos de magistratura federal. Sou contra a criação dos tribunais, pois ela atende ao anseio da magistratura de primeiro grau e consequentemente das associações, bem assim ao interesse eleitoral paroquiano. O interesse dos jurisdicionados não está sendo considerado. Explico: hoje na Justiça Federal temos dois grandes temas causadores de volume de processos (as ações de massa, leia-se consumidor de telefonia, energia, água e outros serviços federais e as ações previdenciárias), todos julgados pelos Juizados Especiais Federais que estão pessimamente estruturados. Precisamos, portanto estruturar os juizados. Dos cinco tribunais dois funcionam até com capacidade ociosa, o da 4ª, Rio Grande do Sul e da 5ª. Regiões, Pernambuco. O da 2ª. Rio de Janeiro, funciona bem, sem atraso demasiado e o da 3ª., São Paulo, depois de brigas intestinas começa a se organizar. O tribunal que ostenta mais problemas é o da 1ª. Região, não somente pela extensão, mas por vontade política dos interessados que não providenciaram estruturação adequada, como por exemplo, a ampliação, aguardando a criação de regionais. Em verdade é o único que mereceria um desdobramento para permitir a criação do Tribunal do Norte, atendendo melhor a região.
O CNJ está sendo suficiente para investigar e dar transparência ao Judiciário?
O CNJ é um grande órgão, o STF, interpretando a Constituição garantiu a sua autonomia, independência e competência ampla. Entretanto, é uma instituição nova, que mexe com uma arraigada cultura de impunidade em nome da segurança jurídica, cultura esta alimentada por grupelhos que se locupletam com a inação e burocratização do Judiciário. Entretanto, o CNJ é suficiente sim, desde que tenha o apoio das Corregedorias e Tribunais estaduais.
Nos últimos anos, o STJ tem julgado muitos casos polêmicos. Como os casos de casamentos homoafetivos. Ainda há resistência por parte dos juízes em aceitar essas decisões ?
Não há como resistir aos direitos de terceira geração a partir do momento em que a sociedade brasileira vai se posicionando em favor da modernidade. Assim, o STJ preparou-se para atender às novas demandas.
Qual a importância da Associação Brasileira das Mulheres de Carreira Jurídica?
É uma grande associação que ajuda as mulheres advogadas a tomar consciência das questões políticas e sociais, direcionando-as na condução da sua profissão. Constituída não só de advogadas, mas de juristas, professoras, membros do Ministério Público e da Magistratura, fortalece a profissional do Direito em termos de reivindicações, luta pelas mulheres menos favorecidas, ao tempo em que contribuem para as políticas públicas voltadas para a questão de gênero.
Fonte: Portal D24AM