Em março de 2015 foi aprovado um novo Código de Processo Civil, o que ocasionou várias alterações no sistema processual brasileiro. Dentre essas, pode-se destacar o incentivo à solução consensual do conflito. Para tanto, além de outras modificações, foi alçada à qualidade de norma fundamental do processo civil a previsão de que a utilização dos métodos adequados de solução dos conflitos deve ser estimulada por todos os atores judiciais (art.3º, §2º e 3º CPC).
Trata-se de mudança que impacta todos os ramos do Direito Cível, sobretudo o de Família, no qual a solução consensual do conflito é ainda mais incentivada e desejada. Um importante instrumento que pode ser utilizado para se alcançar a autocomposição é o negócio jurídico processual, que passou a ser expressamente previsto e regulado (art.190 CPC). Sua aplicabilidade é variada, de maneira que buscaremos delimitar sua análise, ainda que breve, no Direito de Família, mais especificamente na possibilidade de ser inserido no pacto antenupcial.
Nesse ponto, cabe destacar que o pacto antenupcial sempre esteve presente no ordenamento jurídico brasileiro. Desde as Ordenações Filipinas[1] até o Código Civil de 2002, embora haja algumas distinções, tal instituto se fez presente. Saliente-se que o atual Código não inovou muito em relação ao anterior. Com exceção de algumas melhorias técnicas, manteve as regras anteriormente previstas. O art.1.639 do referido diploma legal estabelece que: “É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.”
Dessa maneira, não há muita divergência doutrinária em classificar o pacto antenupcial como negócio jurídico[2], pois a vontade manifestada de forma livre e consciente é essencial para a sua existência, bem como o autorregramento da vontade[3] se dá pois além da possibilidade de escolher regime de bens diverso da comunhão parcial, é possível combiná-los, havendo o que se pode denominar de regime misto de bens.
Ao analisar tal negócio jurídico no plano da existência, verifica-se que o elemento cerne é a manifestação consciente de vontade. Já o elemento completante, é a escolha do regime de bens que vigorará quando realizado o casamento, que, frise-se novamente, pode ser um já expressamente previsto na legislação ou a combinação desses.
Posto isso, em suma, para a existência do pacto antenupcial exige-se que haja acordo de vontades sobre o regime de bens a ser adotado pelo casal. Desse modo, consoante leciona Pontes de Miranda, se alguém diz que doa ou vende a outrem determinado bem com quem vai se casar, não se tem aí pacto antenupcial no sentido aqui definido, mas contrato de doação ou de compra e venda com a condição suspensiva do casamento ou resolutiva, caso esse não ocorra.[4]
Desse modo, parece-nos que não se pode confundir o pacto antenupcial com os demais aspectos patrimoniais, existenciais, e até processuais, que grande parte da doutrina defende a possibilidade de inclusão no pacto antenupcial[5]. Embora entendamos ser possível que o casal regule aspectos existenciais da relação, considerando principalmente o princípio da mínima intervenção estatal no Direito de Família[6], tais ajustes em nada se confundem com o pacto antenupcial. Eles podem valer-se da estrutura e da forma do pacto antenupcial, mas constituem na verdade um negócio jurídico autônomo apenas localizado na escritura pública do pacto antenupcial[7].
Os negócios jurídicos necessariamente transitam pelo plano da validade. Dessarte, na configuração de seu suporte fáctico, além dos elementos nucleares, devem ser considerados outros dados que o complementam, e, por essa razão, são denominados elementos complementares[8]. São elementos que se referem à perfeição dos elementos nucleares, isto é, à validade e/ou à eficácia desses[9].
Para além dos elementos de validade típicos de todos os negócios jurídicos, como a capacidade do agente e a licitude do objeto, o pacto antenupcial estabelece requisitos específicos de validade, os quais serão objeto de análise. O primeiro requisito de validade que deve ser observado é quanto à forma, visto que a legislação expressamente prevê a necessidade de escritura pública[10]. Dessa maneira, a exigência da escritura pública para a validade do pacto antenupcial é uma exceção à regra da liberdade das formas dos negócios jurídicos.
Ademais, também é inválido o pacto antenupcial que contravier disposição absoluta de lei[11]. Posto isso, não é possível a dispensa de alimentos entre os nubentes em caso de divórcio, em razão do disposto no art.1.707 do Código Civil[12]; tampouco é possível a renúncia de herança em caso do falecimento de um dos cônjuges, nos termos do art.426[13] do mesmo diploma legal.
Destaque-se que é perfeitamente possível a declaração apenas parcial de invalidade. Desse modo, caso apenas uma ou duas cláusulas sejam inválidas, o pacto é considerado válido na parte não atingida. Além disso, como já visto, é perfeitamente possível a inserção de outros negócios jurídicos no pacto antenupcial, de maneira que esses podem ser considerados válidos apesar da invalidade do pacto antenupcial[14].
Os negócios jurídicos, depois de passar pelos planos da existência e validade, podem ter ingresso pelo plano da eficácia. Nesse plano é a parte do mundo jurídico onde os fatos jurídicos, aqui expressamente o pacto antenupcial, produzem seus efeitos jurídicos próprios, criando as situações jurídicas[15] com todo seu conteúdo eficacial.
Ressalte-se que para que o pacto antenupcial possa irradiar seus efeitos, é preciso a ocorrência de outro fato jurídico: o casamento[16]. Portanto, o pacto antenupcial pode existir, ser válido, mas jamais chegar a irradiar seus efeitos jurídicos típicos, se um ou ambos os nubentes desistir(em) do casamento, ou revogá-lo[17]. Além disso, em caso de invalidade do casamento, o pacto antenupcial também não poderá produzir efeitos.
Saliente-se que a legislação não prevê prazo para a ocorrência do casamento, podendo ocorrer, em tese, a qualquer tempo. Caso seja certo que o casamento não irá mais ocorrer, como, por exemplo, quando um dos nubentes casa com pessoa diversa, o pacto antenupcial caducará[18].
Ressalte-se, ainda, que é necessária a prática de ato integrativo a fim de que o pacto antenupcial seja eficaz perante terceiros. Dessa maneira, além do registro público do casamento, é preciso registrar o pacto antenupcial no registro de imóveis competente[19].Sem o registro do pacto antenupcial, esse será plenamente válido e eficaz perante os cônjuges, mas não perante terceiros.
No referente aos negócios jurídicos processuais, embora desde a vigência do Regulamento nº737, de 1850, que é considerado o primeiro são previstos no ordenamento jurídico brasileiro, acham-se previstos vários atos que podem enquadrar-se na categoria[20], é com a vigência do Código de Processo Civil de 2015 restou mais evidente.
O sistema processual brasileiro passa a ser estruturado a fim de estimular a autocomposição[21]. Nessa perspectiva, o art.3º, §2º e 3º[22], é claro ao prever que tanto o Estado-Juiz quanto todos os demais atores judiciais devem buscar sempre a solução consensual do conflito. A autocomposição incentivada na referida norma tem a dimensão substancial, quando voltada ao consenso sobre o objeto litigioso do processo, e a dimensão processual, que se volta para a autocomposição sobre o processo ou situações jurídicas processuais[23]. Dessa forma, há o princípio do respeito ao autorregramento da vontade expressamente previsto no Código[24].
Ademais, o Código de Processo Civil estabeleceu uma verdadeira cláusula geral de negociação atípica sobre o processo. O art.190[25] da mencionada legislação, inovando no Direito brasileiro, explicitamente possibilita que, versando sobre direitos que admitam a autocomposição, as partes, plenamente capazes, estipulem mudanças no procedimento a fim de ajustá-lo às especificidades da causa e convencionem sobre os respectivos ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.
Sendo assim, verifica-se que o atual ordenamento jurídico expressamente estabelece a figura dos negócios jurídicos processuais, o que nas lições do professor Pedro Henrique Nogueira[26] pode ser definido como: “[…] o fato jurídico voluntário em cujo suporte fático, descrito em norma processual, esteja conferido ao respectivo sujeito o poder de escolher a categoria jurídica ou estabelecer, dentro dos limites fixados no próprio ordenamento jurídico, certas situações jurídicas processuais.”
Demais disso, tais negócios jurídicos podem ser típicos, que são aqueles já expressamente regulados na legislação[27], ou atípicos, que são aqueles criados pelo autorregramento da vontade das partes, conforme permitido pelo já mencionado art.190 do CPC. Além do mais, podem ser celebrados antes ou durante o processo. Dessa maneira, observa-se a plena possibilidade de se realizar negócio jurídico processual dentro da estrutura do pacto antenupcial. Destaque-se, contudo, que sendo celebrado no pacto antenupcial, e, portanto antes de qualquer procedimento já existente, parece-nos mais adequada a utilização da expressão negócio jurídico pré-processual.
No que tange à existência do negócio jurídico processual, aparenta-nos que os seus elementos nucleares são a vontade manifestada livremente com poder de autorregramento da vontade (=elemento cerne), e a referibilidade ao procedimento (=elemento completante).
Como visto, a declaração de vontade com poder de autorregramento é essencial a todos os negócios jurídicos, já a referibilidade ao procedimento existente é imprescindível que o negócio jurídico seja qualificado como processual. Sem essa referência pode-se até ter negócio jurídico, mas esse não será processual.[28]
Frise-se, porém, que é expressamente admitido que as partes realizem negócio jurídico sobre situações jurídicas processuais antes de um procedimento já existir. Nessas hipóteses parece-nos mais adequado utilizar a expressão negócio jurídico pré-processual[29].
No que tange ao plano da validade, destaque-se que o negócio jurídico processual se submete a um duplo regime jurídico: deve atentar às regras gerais do Direito Civil e ao sistema de validades estabelecido pelo Código de Processo Civil[30]. Para o estudo. também importa saber se é negócio jurídico processual típico ou atípico.
Em todas as espécies, é preciso observar a capacidade processual; a licitude, possibilidade, determinação do objeto; o formalismo processual, bem como a ausência de vícios de vontade[31]. Já os negócios jurídicos atípicos exigem alguns requisitos específicos: (i) possibilidade de autocomposição do direito; (ii) ausência de vulnerabilidade das partes; (iii) ausência de inserção abusiva em contrato de adesão. No que concerne à forma do negócio jurídico processual atípico essa é, em regra, livre, sendo até possível ser realizado oralmente, de maneira expressa ou tácita[32].
A declaração de invalidade somente é possível nas restritas hipóteses legais, e também se houver a comprovação de prejuízo. Em que pese ser inválido o negócio jurídico processual celebrado, não haverá sua declaração se for possível o julgamento de mérito a favor de quem fosse favorecer a declaração, nos termos do art. 282, § 2º, do CPC. Ademais, é admissível apenas a declaração parcial de invalidade do negócio jurídico processual, permanecendo incólume a outra parte.
No tocante à eficácia, conforme preceitua o art.200 do CPC[33], em regra, os negócios jurídicos processuais validamente celebrados são eficazes independentemente de qualquer homologação judicial, podendo irradiar todos os seus efeitos que lhe são típicos. Apenas em caso de expressa previsão legal é que a homologação judicial será requisito de eficácia, como, por exemplo, na desistência da ação[34]. Nessas situações, a homologação judicial é elemento integrativo do suporte fáctico e impede a irradiação imediata da eficácia típica do negócio jurídico processual
Com relação às possibilidades de celebração do negócio jurídico processual, o art.190 do CPC oportuniza que sejam celebradas convenções sobre o procedimento, bem como sobre as faculdades, ônus, poderes, e deveres das partes[35]. Sem a mínima pretensão de exaurir a temática, passa-se a analisar algumas dessas possibilidades, que são variadas, e podem ajudar na rápida e adequada solução do litígio e ainda mais de forma consensual, que como se sabe nas ações de família todos os esforços devem ser empreendidos nesse sentido.
É possível, por exemplo, acordar-se sobre a Comarca que julgará um eventual processo de divórcio. Por ser competência territorial e, portanto, relativa, é plenamente admissível essa negociação.[36] Ademais, é possível também estipular que será adotado o procedimento comum para qualquer ação a ser ingressada com as mesmas partes. Dessa maneira, uma eventual ação de alimentos teria de adotar tal procedimento.
Além desses exemplos, outros podem ser elencados como a desnecessidade da audiência de conciliação prévia; a previsão de métodos alternativos de comunicação das partes entre si (citação e intimação por WhatsApp, por exemplo); a possibilidade da presença da parte contrária durante o colhimento de depoimento pessoal[37]. Além disso, nos parece possível também se estipular que eventual execução de alimentos será cumulado o rito da penhora e o da prisão[38].
Há também diversas possibilidades de se acordar sobre as faculdades, ônus, poderes e deveres das partes. É possível desde um pacto de divisão de custas processuais; a alteração na contagem dos prazos, seja diminuindo os dias e/ou determinando que a contagem deve se dar em dias corridos; até a limitação aos poderes probatórios das partes. Nesse último ponto, seria possível a convenção para tornar ilícita a juntada de provas que exponham a privacidade e a intimidade das partes, inclusive estipulando-se multa caso seja realizada[39].
Além disso, outra possibilidade no campo probatório é a nomeação antecipada de um perito que avaliará o valor dos bens partilháveis. É uma alternativa interessante que traria celeridade, sobretudo nos casos que envolvem a partilha de empresas na qual se precisa de cálculo especializado do valor das quotas.
Com relação aos limites, o negócio jurídico processual atípico, além de ter que observar os requisitos de validade do direito material, inclusive a simulação e a fraude à lei, deve atentar para as regras cogentes processuais, isto é que sejam inafastáveis pelas partes[40]. Nessa perspectiva, leciona Pedro Henrique Nogueira que os limites para o exercício do poder de autorregramento das partes no direito processual se encontram no formalismo processual[41].
Conforme alude o referido autor, trata-se de uma expressão ampla que engloba não apenas as formalidades, mas também a delimitação dos deveres, poderes e faculdades processuais dos sujeitos, de modo que abrange tanto os princípios, formadores do “estatuto básico processual”, quanto as demais regras ordenadoras da atividade processual[42].
Dessa maneira, não é possível negócios jurídicos processuais, por exemplo, para suprimir a primeira e o processo já ser julgado em segunda instância; para não haver a representação processual das partes por advogado; para criar um novo tipo de recurso ou para afastar a intervenção obrigatória do Ministério Público; ou, ainda, que os processos não tramitem em segredo de justiça[43]. Não nos parece possível a celebração de negócio jurídico processual a fim de que o processo prossiga independentemente de citação validamente realizada.
Saliente-se que apenas em casos excepcionais deve ser declarada a invalidade do negócio jurídico processual celebrado. Ressalvada a hipótese de alguma interpretação restritiva, na dúvida deve-se admitir a celebração do negócio jurídico – in dubio pro libertate, na expressão de Peter Schlosser utilizada por Fredie Didier Jr[44].
Os negócios jurídicos processuais atípicos são instrumentos relevantes para se alcançar uma prestação jurisdicional rápida, justa e efetiva. São plenamente admissíveis em diversos ramos do Direito, principalmente no de Família, no qual se deve incentivar ainda mais a solução consensual da controvérsia.
Trata-se de uma temática que ainda está sendo bastante debatida doutrinariamente, e, desse modo, buscamos trazer algumas possibilidades que nos parecem interessantes. Saliente-se, ademais, que não há balizas interpretativas já consolidadas sobre os limites, cabe à academia buscar estabelecer diretrizes apropriadas, considerando, sobretudo, que alguns casos já estão sendo analisados pelos Tribunais.
Manoel Victor de Mello Vianna
Mestrando em Direito pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL);
LLM em Direito Empresarial pela FGV-RJ;
Graduado em Direito.
Advogado no escritório Marcos Bernardes de Mello advogados & associados.
Pedro Henrique Nogueira
Pós-doutor (UFPE). Doutor (UFBA) e Mestre em Direito (UFAL).
Professor associado na Universidade Federal de Alagoas (graduação e mestrado).
Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP)
e do Instituto Iberoamericano de Direito Processual.
Advogado.
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REFERÊNCIAS
BIAZI, João Pedro de Oliveira de. Pacto antenupcial: uma leitura à luz da Teoria do Negócio Jurídico. Revista Jurídica Luso-Brasileira. Lisboa, ano 2. n. 1, p.229-264.
BRASIL. Lei n. 13.105 de 16 de março de 2015..Código de Processo Civil. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 17 març.. 2015. Disponível em: <https://legislacao.presidencia.gov.br/atos/?tipo=LEI&numero=13105&ano=2015&ato=c61QTS65UNVpWTc75 > Acesso em: 21. jun. 2022.
BRASIL. Lei n.10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm> Acesso em: 25 jan. 2022.
DIDIER JR., Fredie. Princípio do respeito ao autorregramento da vontade no processo civil. In: CABRAL, Antônio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique (Coord.). Negócios processuais. 4.ed. Salvador: Juspodivm, 2019
__________________. negócios jurídicos processuais atípicos no CPC-2015. In: CABRAL, Antônio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique (Coord.). Negócios processuais. 4.ed. Salvador: Juspodivm, 2019
______________________. Ensaios sobre os negócios jurídicos processuais. Salvador: Juspodivm, 2018
MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da existência. 22.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019,
MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado: parte geral, tomo III. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983
____________________. Tratado de Direito Privado: parte especial, tomo VIII. 3.ed. São Paulo: Editor Borsoi, 1971.
NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, 2018.
_____________________. Gestão da execução por meio de negócios jurídicos processuais no processo civil brasileiro. Revista de processo / Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), v. 43, n. 286, p. 325–342, dez., 2018.
Notas
[1] “Todos os casamentos feitos em nossos Reinos e Senhorios se entendem serem feitos por Carta de ametade, salvo quando entre as Partes outra coisa fôr acordada e contractada, porque então se guardará o que entre elles for contractado” Ord. Fil. L. IV. T. XLVI.
[2] Em linhas gerais, consoante leciona Marcos Bernardes de Mello, entende-se como negócio jurídico o fato jurídico cujo elemento nuclear do suporte fáctico consiste em manifestação ou declaração consciente de vontade, em relação à qual o sistema jurídico permite que, dentro dos limites e de amplitude variados, os sujeitos escolham a categoria jurídica, a estruturação do conteúdo eficacial das respectivas relações jurídicas, quanto ao seu surgimento, intensidade e permanência no mundo jurídico.
[3] Nas palavras de Pontes de Miranda, entende-se como autorregramento da vontade a margem de liberdade conferida pelo direito a fim de que os sujeitos regulem seus interesses. Para além do “querer” ou “não querer”, o autorregramento possibilita o“até onde se pode querer”. Saliente-se que o autoregramento sempre ocorrerá dentro dos limites já pré-fixados pelo direito, de modo que, consoante enfatiza o aludido autor, é o que restou às pessoas dos limites já definidos em lei. In: MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado: parte geral, tomo III. 4.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983, p.54-55
[4] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado: parte especial, tomo VIII. 3.ed. São Paulo: Editor Borsoi, 1971, p.228.
[5] Nesse sentido, o Enunciado n.635 das Jornadas de Direito Civil: “O pacto antenupcial e o contrato de convivência podem conter cláusulas existenciais, desde que estas não violem os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre os cônjuges e da solidariedade familiar.”
[6] Dessa forma, julgamos ser possível, dentre outras possibilidades, a pactuação de multa em caso de traição, o afastamento do dever de fidelidade, assim como a previsão de alimentos a serem custeados pelo outro cônjuge em caso de afastamento do trabalho.
[7] Nesse mesmo sentido: BIAZI, João Pedro de Oliveira de. Pacto antenupcial: uma leitura à luz da Teoria do Negócio Jurídico. Revista Jurídica Luso-Brasileira. Lisboa, ano 2. n. 1. p.249.
[8] MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da existência. 22.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p.100.
[9] MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da existência. 22.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p.100.
[10] Art. 1.653. É nulo o pacto antenupcial se não for feito por escritura pública, e ineficaz se não lhe seguir o casamento.
[11] Art. 1.655. É nula a convenção ou cláusula dela que contravenha disposição absoluta de lei.
[12] Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.
[13] Art. 426. Não pode ser objeto de contrato a herança de pessoa viva.
[14] MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado: parte especial, tomo VIII. 3.ed. São Paulo: Editor Borsoi, 1971, p.231-242.
[15] A expressão aqui é empregada em seu sentido lato, abrangendo as situações unisubjetivas e as relações jurídicas. No caso do pacto antenupcial, por ser negócio jurídico bilateral, formar-se-à uma relação jurídica.
[16] Art. 1.653. É nulo o pacto antenupcial se não for feito por escritura pública, e ineficaz se não lhe seguir o casamento. Nesse ponto o Código Civil vigente consertou a atecnia do anterior que considerava causa de invalidade a não ocorrência do casamento.
[17] LÔBO, Paulo. Direito civil: Famílias. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p.331.
[18] ROSA, Conrado Paulino da. Direito de família contemporâneo. 7.ed. rev.atuall. ampl. Salvador: Juspodivm, 2020, p.243
[19] LÔBO, Paulo. Direito civil: Famílias. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p.333.
[20] NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, 2018, p.160.
[21] DIDIER JR., Fredie. Princípio do respeito ao autorregramento da vontade no processo civil. In: CABRAL, Antônio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique (Coord.). Negócios processuais. 4.ed. Salvador: Juspodivm, 2019, p.40.
[22] “Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. […] § 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. § 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.”
[23] NOGUEIRA, Pedro Henrique. Gestão da execução por meio de negócios jurídicos processuais no processo civil brasileiro. Revista de processo / Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP), v. 43, n. 286, p. 325–342, dez., 2018.
[24] DIDIER JR., Fredie. Princípio do respeito ao autorregramento da vontade no processo civil. In: CABRAL, Antônio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique (Coord.). Negócios processuais. 4.ed. Salvador: Juspodivm, 2019, p.40.
[25] “Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.”
[26] NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, .2018, p.175.
[27] Dentre outros negócios jurídicos processuais típicos: calendário processual (art.191 CPC); renúncia ao prazo (art.225); suspensão consensual do processo (art.313, II, CPC); escolha consensual do perito (art.471 CPC).
[28] Com esse pensamento NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, .2018, p.207-208.
[29] Inclusive é a partir desse entendimento que no título do presente trabalho foi colocado entre parênteses. No entanto, boa parte da doutrina utiliza o termo “processual” se o negócio jurídico for referente à processo atual ou futuro. Saliente-se, que o Professor Pedro Henrique Nogueira também utiliza a expressão aqui adotada. NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, .2018
[30] NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, .2018, p.270.
[31] NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, .2018, p.270.
[32] DIDIER JR., Fredie. Ensaios sobre os negócios jurídicos processuais. Salvador: Juspodivm, 2018 p.40
[33] Art. 200. Os atos das partes consistentes em declarações unilaterais ou bilaterais de vontade produzem imediatamente a constituição, modificação ou extinção de direitos processuais.
[34] “Art. 200. […] .Parágrafo único. A desistência da ação só produzirá efeitos após homologação judicial.”
[35] NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, 2018, p.263.
[36] Imagine-se que o casal possui residência em mais de uma comarca, ou cada cônjuge em razão profissionais tenham outra residência, é plenamente possível a celebração de negócio jurídico pré-processual para de antemão já delimitar a comarca que julgará eventual ação.
[37] Nesse sentido, Enunciado nº 19 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “São admissíveis os seguintes negócios processuais, dentre outros: pacto de impenhorabilidade, acordo de ampliação de prazos das partes de qualquer natureza, acordo de rateio de despesas processuais, dispensa consensual de assistente técnico, acordo para retirar o efeito suspensivo de recurso, acordo para não promover execução provisória; pacto de mediação ou conciliação extrajudicial prévia obrigatória, inclusive com a correlata previsão de exclusão da audiência de conciliação ou de mediação prevista no art. 334; pacto de exclusão contratual da audiência de conciliação ou de mediação prevista no art. 334; pacto de disponibilização prévia de documentação (pacto de disclosure), inclusive com estipulação de sanção negocial, sem prejuízo de medidas coercitivas, mandamentais, sub-rogatórias ou indutivas; previsão de meios alternativos de comunicação das partes entre si; acordo de produção antecipada de prova; a escolha consensual de depositário-administrador no caso do art. 866; convenção que permita a presença da parte contrária no decorrer da colheita de depoimento pessoal.”
[38] Embora não haja vedação legal, em regra as varas impedem a cumulação. Uma vez estabelecido em negócio jurídico pré-processual, o juiz ficaria vinculado ao que fora celebrado.
[39] Se trataria de uma”cláusula anti-baixaria” na expressão utilizada pelo professor Rodrigo Mazzei em live sobre o assunto, mas que até então não se encontra em algum escrito dele.
[40] NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, 2018, p.184.
[41] NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, 2018, p.185.
[42] NOGUEIRA, Pedro Henrique. Negócios jurídicos processuais. 3.ed. rev., ampl e atual. Salvador: Juspodivm, 2018, p.185-186.
[43] Nesse sentido, Enunciado nº 20 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “Não são admissíveis os seguintes negócios bilaterais, dentre outros: acordo para modificação da competência absoluta, acordo para supressão da primeira instância, acordo para afastar motivos de impedimento do juiz, acordo para criação de novas espécies recursais, acordo para ampliação das hipóteses de cabimento de recursos”
[44] DIDIER JR., Fredie. negócios jurídicos processuais atípicos no CPC-2015. In: CABRAL, Antônio do Passo; NOGUEIRA, Pedro Henrique (Coord.). Negócios processuais. 4.ed. Salvador: Juspodivm, 2019, p.126.