Autor da Editora Fórum, com a obra “Propaganda eleitoral e o princípio da liberdade da propaganda política“, Carlos Neves Filho concedeu longa entrevista ao jornal Diário de Pernambuco, como referência do tema:
Confira:
Entrevista especial >> Carlos Neves Filho
Fonte: Diário de Pernambuco Online – PE – 28/05/2012
Pela liberdade de expressão
Com o estilo ousado e com a fala moderada, o advogado pernambucano Carlos Neves Filho propõe um desafio: esclarecer, entre códigos e legislações adversas, os principais desafios da lei eleitoral brasileira. “A propaganda política é um dos pilares da democracia”, defende. A citação é oportuna e revela a preocupação do acadêmico com um dos principais “problemas” de um ano eleitoral. Programas de rádio e televisão com conteúdos partidários ganham a atenção não só do público, mas também dos tribunais. Além disso, a internet, que aparenta ser uma “arma nova da democracia”, por dar mais liberdade de interação e expressão, começa a ser contestada. Na contramão desse caminho e com a experiência de ter assessorado mais de 50 candidatos majoritários em Pernambuco, Carlos Neves defende uma reforma dessa legislação eleitoral e na interpretação da mesma, sem esquecer do direito à liberdade. Autor de Propaganda eleitoral e o princípio da liberdade da propaganda política, que chega às livrarias em junho, Neves transforma a linguagem jurídica em informação para o grande público. Confira a entrevista concedida ao Diario.
“A propaganda política é um dos pilares da democracia”
Num ano eleitoral como este, muitas pessoas desligam a televisão ou o aparelho de rádio quando começa a propaganda política. O guia afirma com antecedência que é um espaço gratuito…
O horário eleitoral, no Brasil, de gratuito não tem nada. A veiculação da propaganda na TV e rádio que, aparentemente aponta a gratuidade, na verdade se dá por intermédio de uma compensação tributária: as emissoras, por serem concessionárias públicas, têm a obrigação de ceder o espaço, mas abatem, dos impostos a pagar, os valores referentes aos tempos destinados à veiculação eleitoral – pagamos todos nós. Por outro lado, cada vez mais os gastos eleitorais para fazer estes filmes políticos são elevados – buscam qualidade justamente para que as pessoas não desliguem o rádio e a TV, já que concorrem com a publicidade de produtos comerciais e programas de entretenimento. Esses gastos eleitorais podem vir de dinheiro público, ou seja, do Fundo Partidário, fundo mantido por verbas do orçamento da União, destinados especialmente para que os partidos com assento na Câmara Federal, na proporção de sua bancada, possam se manter, o que depende da propagação de suas ideias.
Então, ao desligar o aparelho de TV, o eleitor estaria, num gesto impensado, “jogando dinheiro fora”?
A propaganda política é um direito do partido político, expresso na Constituição de 1988, e mesmo que ninguém veja ou escute, ela vai ser exibida, e os gastos públicos ali aplicados (direta ou indiretamente) vão continuar a existir. A solução para essa apatia do eleitor tem sido as inserções, aquelas propagandas de 30 segundos, que se tornaram a vedete da propaganda política, porque entram misturadas com a propaganda de produtos comerciais, sendo quase impossível não vê-las ou ouvi-las. Mas é fundamental lembrar que esse direito também é do eleitor. É dele o direito de conhecer as opiniões, ideologias e teses das mais diversas correntes, para chegar a sua livre escolha de quem tem a melhor proposta e, consequentemente, escolher quem é o seu representante. Assim, desligar a TV e o rádio, além de desperdiçar dinheiro público, acaba por dispensar o direito de receber informações políticas e formar as suas convicções.
Isso, em parte, é culpa da própria legislação eleitoral vigente (que deixa, também, margens para diversas interpretações)? Ou é o simples fato de que as pessoas, ainda, não têm informações precisas sobre estes direitos?
A lei eleitoral é bastante restritiva à propaganda, além de ser constantemente modificada, o que dá margem a interpretações das mais diversas. Mas, na minha opinião, o grande equívoco é que se parte da ideia de que a propaganda eleitoral deve ser sempre tolhida. Defendo e demonstro que propaganda eleitoral é parte integrante da liberdade de expressão na esfera política, garantida constitucionalmente. Não se pode limitar a circulação de ideias, posto que o fundamento da democracia é justamente o debate e a multiplicidade de opiniões. Nos regimes totalitários é que se pretende a unicidade política. Esse é o principal motivo da confusão e a falta de informação sobre a propaganda eleitoral: parte-se do entendimento que deve ser proibida. A própria legislação sobre a matéria é restritiva, cheia de vírgulas e regras proibitivas, levando a crer que a propaganda política deve ser limitada. Mas, se adotarmos o princípio da liberdade de expressão, a propaganda eleitoral é e deve ser livre, limitando-se apenas quando ferir o princípio democrático, a soberania do país ou direitos fundamentais da pessoa humana, como a vida e a honra. Precisamos, então, modificar o ponto de partida sobre a propaganda, o que resultaria na alteração não só da legislação, como da interpretação que lhe é dada.
E essa falta de informação também se dá entre as diferenças de um guia eleitoral para um guia partidário. Quais seriam as principais disparidades entre os dois?
A propaganda eleitoral é espécie do gênero propaganda política, onde se incluem ainda a propaganda partidária, a intrapartidária e a publicidade institucional. A partidária tem por finalidade divulgar a plataforma, os quadros e a ideologia dos partidos para angariar adeptos; já a propaganda eleitoral visa a conquista direta do voto do eleitor. A confusão se dá, pois, em anos eleitorais, a propaganda partidária dificilmente não tem conotação eleitoral — não há dúvidas que, em regra, só há elogio ao futuro candidato do partido no semestre que ainda se permite a propaganda partidária na TV e no rádio. Mas tudo isso ocorre pois se permite que o postulante a candidato apareça nessa propaganda, mas se impede que ele fale em eleições e nas composições políticas que está firmando, apesar do mesmo falar abertamente disso em programas de rádio, TV e na imprensa escrita. Assim, vê-se que o tempo da política não tem encontrado respaldo no tempo do direito: ou se proíbe as propagandas partidárias durante todo o ano de eleição, impedindo o desvirtuamento para fins eleitorais, ou se permite maior inserção das questões eleitorais, reconhecendo-se que nessa fase tudo no partido, nas ruas, nos jornais, é voltado às eleições, o que é muito mais próximo da realidade.
Mas, quando chegamos perto das eleições, começam os debates em torno dos limites da internet… podemos falar em limites na internet ou a propaganda nesse meio é algo sem controle?
Defendo a liberdade da propaganda e, diante da diferença entre internet e a propaganda de rádio e TV, pode-se afirmar que a propaganda eleitoral na internet é livre – o que não implica em dizer liberdade absoluta. Como toda liberdade de expressão, na internet a liberdade é responsável, assim não pode ter cunho ofensivo à honra, nem caráter discriminatório, bem como não se admite o anonimato. Para tentar impedir a interferência econômica, vedou-se a propaganda paga e em sites de pessoas jurídicas, o que não se confunde com redes sociais, pois nestas quem posta o conteúdo é o indivíduo e não a empresa que gerencia o Facebook ou o Twitter.
Saiba mais
Carlos Neves Filho é advogado, formado em direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). É mestre em direito pela Universidade de Lisboa e professor da Faculdade Estácio do Recife
Foi diretor da Escola da Advocacia Ruy Antunes e conselheiro da Escola Nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Hoje é sócio da conceituada banca de advogados CMP, onde é sócio desde
o ano de 2007
Atualmente, coordena a pós-graduação de direito eleitoral da Escola Judiciária do Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco (TRE-PE). Também é diretor do Instituto Egídio Ferreira Lima desde 2008
Responsável pela assessoria jurídica de mais de 50 candidatos majoritários e proporcionais em Pernambuco, nos últimos anos, Carlos Neves Filho está se consolidando como uma referência em direito eleitoral no país
Vai lançar, no começo de junho, o livro Propaganda eleitoral e o princípio da liberdade da propaganda política, com o selo da Editora Fórum.