– por Rodrigo Pironti Aguirre de Castro, publicado originalmente em seu blog.*
Assistimos cada vez mais perplexos aos desmandos e as freqüentes notícias de corrupção na Gestão Pública brasileira. Freqüentemente afirmarmos ser este um problema histórico, conjuntural da realidade política em nosso país, como se a solução dessas questões não fosse possível, ou pior, como se nós – cidadãos – nada pudéssemos frente ao “poder” político.
Talvez um dos pontos fundamentais para essa sensação de “desamparo” seja a escassez de real informação e transparência do Pode Público, que se limita – muitas vezes – a reproduzir dados contábeis e financeiros complexos e exaustivos, como se isso fosse inteligível ao cidadão “comum”, reduzindo drasticamente a possibilidade de controle das políticas públicas.
Controle! Esse deveria ser o foco de toda e qualquer gestão pública eficiente, pois não há transparência sem controle, não há atendimento de necessidades públicas sem controle, não há destinação eficaz de recursos sem controle, vale dizer, um Estado que justifica cumprir seu papel, mas não realiza e nem permite realizar um real controle de sua gestão não é um Estado eficiente e diligente, mas sim, servidor implacável da frustração do interesse público, e é sobre isso que os convido a pensar nessas breves e sintéticas linhas sobre o “descontrole” da gestão da coisa pública em nosso país.
Nesse ponto gostaria de chamar a atenção para um aspecto que me parece fundamental para que esses desvios de conduta dos gestores públicos sejam banidos em todos os poderes e funções do Estado, qual seja, a falta de um efetivo Sistema de Controle Interno, que para além do papel, contemple os requisitos constitucionais de implantação e estruturação, uma metodologia moderna e eficaz de fiscalização e atue de forma gerencial e preventiva ao cometimento das irregularidades.
Muito embora imaginemos tratar-se de um tema novo, a exigência de Controle Interno existe em nosso país no mínimo desde a Lei 4.320/64 (para mencionar um texto legal), e foi recepcionado como “sistema” pela Constituição de 1988, tendo merecido também destaque de tratamento na Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/00). Ocorre que desde que foi exigida a implantação desse sistema, muito pouco – ou quase nada – havia sido feito, até que os Tribunais de Contas, já em meados da primeira década deste século, cientes e bem cumpridores de seu papel auxiliar no controle externo, passaram a exigir a comprovação de implantação desse sistema como condição para aprovação das contas dos Municípios e Estados.
A partir daí, Estados e Municípios saíram em disparada para aprovar suas leis de “Controle Interno” nos respectivos Legislativos, para que assim fosse possível apresentá-las aos Tribunais de Contas e justificar a possibilidade de aprovação de suas contas. Mas se a exigência dos Tribunais foi acolhida por grande parte dos Municípios e pelo Estado, onde então estaria o motivo para que esse Sistema fosse o grande propulsor do “descontrole” estatal? Inclusive ante as recentes notícias de falhas no Sistema de Controle Interno do Governo do Estado do Paraná.
A resposta para este questionamento é simples, algumas exigências básicas impostas pela Constituição e desejadas pelo cidadão para que esse sistema fosse realmente efetivo foram deixadas de lado; talvez por desatenção, talvez por falta de assessoramento técnico ou ainda por desinteresse político, o que fez com que, infelizmente, hoje tenhamos sistemas de controle interno implantados mas que, ao revés de permitirem um melhor aproveitamento e controle da gestão pública, servem à política do “descontrole” e funcionam como justificadores de condutas desarrazoadas dos gestores e malversação dos recursos públicos, de forma burocrática e não gerencial.
No Paraná, por exemplo, grande parte dos Municípios e o Estado se adequaram às exigências do Tribunal de Contas no tocante a aprovação da legislação de controle interno, mas em contraponto, permanecem totalmente “descontrolados”, pois a formatação legal do controle serviu apenas para cumprimento do requisito formal exigido – comprovação de que existe uma unidade de controle – mas não permitiu eficiência de gestão, redução de irregularidades e a salvaguarda do erário e do interesse público.
Basta uma simples conversa com qualquer servidor responsável pelo controle nestes entes para que nos seja revelado: “Temos a Lei, mas ela não funciona!”.
Motivos existem vários: dificuldade de implantação e definição de metodologia de risco coerente, falta de servidores qualificados ou de conhecimento técnico específico, desinteresse político na correta implantação e estruturação, completa falta de independência e autonomia do controlador, dentre outros.
O moderno enfoque da gestão pública brasileira não permite que o “sistema de controle interno”, um dos principais mecanismos de controle gerencial atualmente existentes em nosso Estado seja relegado ao acaso como pretendem alguns gestores.
É nesse sentido que, para além do mero controle de legalidade, é crescente nos Tribunais o denominado controle substancial (ou de legitimidade), que impõe não apenas a implantação formal do controle interno, mas principalmente o estabelecimento de parâmetros e metas objetivas e a real comprovação do cumprimento desses ideais.
Certo é que, após o importante primeiro passo dos Tribunais de Contas brasileiros como timoneiros da exigência de implantação desse sistema, assistimos ansiosos às diligencias e auditorias destas Cortes na verificação da eficiência dos controles internos e às respectivas punições aos gestores quando da constatação de ineficiência desses controles, pois quem sabe assim, possamos, muito embora sabedores de que fantasmas existem, dormir sem que sejamos assombrados por eles.
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* Rodrigo Pironti Aguirre de Castro
Autor da Obra “Sistema de Controle Interno: uma perspectiva do modelo de gestão pública gerencial” e Consultor Jurídico especializado em Controle Interno Gerencial.