Abuso no exercício da liberdade de expressão e indignidade no Direito de Família | Coluna Direito Civil

5 de outubro de 2021

 

Há muito o Direito Privado se preocupa com a configuração de condutas demeritórias, que tornam os que as praticam indignos. Nesse sentido, são imemoriais as noções de ingratidão do donatário, apta a ensejar a revogação da doação, e de indignidade do herdeiro ou legatário, suficiente para autorizar a exclusão da sucessão ou a deserdação.

Contudo, o procedimento indigno, com impactos nos alimentos do Direito de Família, não era previsto no Código Civil de 1916, tendo sido estabelecido no parágrafo único do art. 1.708 do Código Civil de 2002.

Dentro deste contexto, no artigo que desenvolvemos para a obra Liberdade de expressão e relações privadas, verificamos se seria doutrinariamente viável e se, na prática forense no país, o abuso no exercício da liberdade de expressão tem sido suscitado para a configuração de procedimento indigno, apto a extinguir o direito a alimentos do indigno ou reduzir o respectivo valor.

A relevância do tema se demonstra pela existência de uma “inevitável tensão”[1] entre a liberdade de expressão e os direitos da personalidade, tais como os direitos à honra, à intimidade, à vida privada e à imagem, o que pode configurar a chamada colisão de direitos fundamentais,[2] tornando complexa a solução, pois tais direitos desfrutam do mesmo status jurídico e se situam no mesmo nível axiológico.[3]

Para alcançar o objetivo traçado, utilizamos, no trabalho, as metodologias de pesquisa doutrinária e jurisprudencial, para a criação de um quadro diagnóstico e propositivo do assunto. Ao longo do trabalho, nos comentários aos resultados, construímos o nosso posicionamento.

Considerando os limites dos artigos que compõem a obra, para a pesquisa doutrinária o tema foi consultado especificamente em seis obras que tratam de Direito de Família e de alimentos.

A pesquisa jurisprudencial, por sua vez, foi realizada no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e nos vinte e sete Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal.

Considerando as obras doutrinárias consultadas, verificamos que o posicionamento majoritário (83,33%) comporta a configuração de procedimento indigno por abuso no exercício da liberdade de expressão.

Com relação à jurisprudência, verificamos que ainda são pouco numerosos os casos que chegaram à segunda instância envolvendo a configuração de procedimento indigno (apenas 19 em todo o país, nos 18 anos de vigência do Código Civil de 2002). Quase metade dos que chegaram (47,36%), por sua vez, envolveram a configuração de procedimento indigno por condutas que, na linha desenvolvida neste trabalho, podem ser consideradas como de abuso no exercício da liberdade de expressão. Em apenas um terço desses casos, no entanto, entendeu-se que houve a configuração de procedimento indigno.

Fica aqui o convite para a leitura completa no nosso artigo, que em que expusemos e comentamos os posicionamentos doutrinários levantados, e em que organizamos, expusemos e comentamos os julgados encontrados.

O tema, sem dúvida, é de grande relevância, e ainda carece de muita atenção.

 

Felipe Quintella é doutor, mestre e bacharel em Direito pela UFMG.
Professor dos cursos de graduação e mestrado em Direito da Faculdade de Direito Milton Campos. Coordenador-geral da Faculdade de Direito Milton Campos. Professor do Ibmec BH. Sócio-fundador do Quintella e Righetti Advocacia e Consultoria

 

 

 

 

Tereza Cristina Monteiro Mafra é doutora, mestra e bacharela em Direito pela UFMG.
Professora dos cursos de graduação e de mestrado em Direito da Faculdade de Direito Milton Campos. Diretora da Faculdade de Direito Milton Campos. Sócia-fundadora do Tereza Mafra Advocacia.

 

 

[1] MENDES, Gilmar Ferreira. Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 648.
[2] FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. 2. ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2000, p. 171.
[3] BARROSO, Luís Roberto. Colisão entre liberdade de expressão e direitos da personalidade: Critérios de ponderação. Interpretação constitucionalmente adequada do Código Civil e da Lei de Imprensa. In: http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/45123/45026. Acesso em: 13 jan. 2021.

 

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