Os exemplos mais recentes de licitações para gestão de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, no Rio Grande do Sul e em Olímpia, São Paulo, indicam que é possível sim, colocar em prática modelos diferentes de gestão desses serviços, sendo eles operados por empresas públicas ou privadas.
O chamado novo marco regulatório do saneamento, como já se fala desde sua aprovação, ao invés de pacificar o setor, incentivou a disputa ao contrário de alimentar a competitividade pela demonstração de resultados medidos pela melhoria da qualidade dos serviços e não pelo CAPEX ou, pior ainda, por outorgas bilionárias surgidas de planos de negócio não explicados.
Paradoxalmente, apesar de seu caráter polêmico e impositivo de um modelo único, o novo marco promoveu a primeira mudança real na zona de conforto das Companhias Estaduais de Saneamento desde o final dos anos 90 e início do século XXI, provocando também algumas revisões de postura gerencial nos serviços municipais, bem como nos operadores privados que disputam o mercado com operadoras de energia elétrica e fundos de investimentos.
Se fosse possível resumir a essência do novo marco em poucas palavras, poder-se-ia afirmar que ele trouxe o saneamento ao centro das discussões nacionais com temas como regionalização e, novamente, maior participação de operadores privados na prestação dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário.
A escolha do melhor modelo de regionalização, foi e é, sem dúvidas, um dos desafios em curso, cujos resultados só serão conhecidos daqui a alguns indefinidos anos, espera-se que poucos anos. Um problema, não há como negar, é a existência de formas de regionalização que tornam compulsória a participação de municípios, sob a alegação de busca de escala ou de que um município mais rico e em melhores condições de saneamento, deve abrir mão de sua autonomia administrativa em favor dos municípios mais pobres.
É claro que dadas as diferenças econômicas, sociais, ambientais, climáticas e hídricas que o Brasil possui, desenhar uma regionalização que satisfaça a todos não foi e não será uma tarefa fácil para os 07 ou 08 municípios onde os processos ainda tramitam. Algo porém seria e ainda é essencial: informação, conhecimento e transparência sobre o modelo e como os municípios passarão a atuar em microrregiões de saneamento ou unidades regionais.
Sobre a participação do setor privado, registra-se com base nos dados da ABCON, que em 2020 havia 291 municípios operados por empresas privadas e em 2022 este número atingiu a casa de 509 municípios, alcançando cerca de 50 milhões de habitantes, em significativo avanço após a aprovação do novo marco regulatório.
Este avanço do setor privado não deve significar a exclusão pura e simples dos operadores públicos, entretanto, deveria indicar a possibilidade de arranjos de mercado que garantam a universalização, sem exclusões como as vistas nas recentes concessões.
Infelizmente, o saneamento ainda sofre da síndrome da convergência divergente. Todos querem a universalização, porém os caminhos propostos parecem ser estradas paralelas que não se unem nem em um ponto futuro, a julgar pela situação atual onde se discute muito mais o mérito de leis e decretos que a sua aplicação em favor da sociedade.
Um alento pode ser verificar que graças a força da hermenêutica e o peso das discussões no âmbito jurídico-legislativo, sempre lentas, o mercado segue se movimentando sob riscos jurídicos e insegurança, porém, acreditando que agora há mais espaço para avanços.
Aproveitando o momento pós-congresso da ABES, apesar das expectativas sobre como o Senado analisará os vetos da Câmara, há uma esperança realista de que é possível formar uma frente em favor da universalização para todos e com a participação de todos os tipos de operadores.
Assim, salvo engano, os avanços que podem ser medidos a favor da sociedade não são as outorgas pagas. Os avanços estão na mobilização das companhias estaduais de saneamento, as quais, perderam o medo de buscar soluções com parcerias junto a operadoras privadas e, até mesmo, abrir mão de seu papel de concessionária; nos estudos promovidos por Prefeituras de médio e pequeno porte em busca de soluções via operadores privados e na oportunidade que estes têm para apresentar soluções adequadas ao porte e condições de municípios que buscam soluções realistas e sustentáveis para a universalização efetiva.
Álvaro José Menezes da Costa
Eng. civil. MSc em Recursos Hídricos e Saneamento, CP3P-F
Consultor
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