O livro Liberdade de expressão e desinformação em contextos eleitorais do autor da FÓRUM, Elder Maia Goltzman, foi amplamente citado em recente decisão da ministra do Tribunal Superior Eleitoral – TSE, Maria Claudia Bucchianeri.
Na representação de número 0600859-89.2022.6.00.0000, disponível no site do tribunal, a juíza auxiliar analisou um caso de “propaganda eleitoral irregular por meio de publicações sabidamente falsas, forjadas com o claro objetivo de induzir o eleitorado em erro.”
Na decisão, a ministra explica que “a propagação de desinformação” é um “comportamento que vulnera a ‘higidez e a integridade do ambiente informativo’, valores que justificam e legitimam a intervenção corretiva da Justiça Eleitoral”.
Para sustentar os argumentos, cita parte dos estudos realizados pelo autor, Elder Maia Goltzman.
“[…] muito embora a maximização do espaço de livre mercado de ideias políticas e a ampla liberdade discursiva na fase da pré-campanha e também no curtíssimo período oficial de campanha qualifiquem-se como fatores que catalisam a competitividade da disputa e que estimulam a renovação política e a vivacidade democrática, a difusão de informações inverídicas, descontextualizadas ou enviesadas configuram prática desviante, que gera verdadeira ‘falha no livre mercado de ideias políticas’, deliberadamente forjada para induzir o eleitor em erro no momento de formação de sua escolha.
Daí as preciosas observações de Elder Maia Goltzman, na obra Liberdade de Expressão e Desinformação em Contextos Eleitorais (Belo Horizonte: Ed. Fórum, 2022, p. 54), para quem ‘é preciso empoderar o cidadão para que possa tomar suas decisões relativas à esfera pública de maneira consciente e ancorado em informação de qualidade, não em narrativas fabricadas ou versões construídas e distribuídas para ludibriá-lo’.”
Imagem/internet da representação 0600859-89.2022.6.00.0000 com a citação do livro Liberdade de Expressão e Desinformação em Contextos Eleitorais de Elder Maia Goltzman
E reforça:
“Não há a menor dúvida de que a desinformação e a desconstrução de figuras políticas a partir de fatos sabidamente inverídicos ou substancialmente manipulados devem ser rapidamente reprimidas pela Justiça Eleitoral, por configurarem, como dito, verdadeira falha no livre mercado de circulação das ideias políticas, que pode desembocar na indução do eleitor em erro, com comprometimento da própria liberdade de formação da escolha cidadã. A identificação, no entanto, daquilo que possa ser enquadrado como conteúdo desinformativo traz significativos desafios. Não desconheço que a desinformação não se limita à difusão de mentiras propriamente ditas, compreendendo, por igual, o compartilhamento de conteúdos com elementos verdadeiros, porém gravemente descontextualizados, editados ou manipulados, com o especial intento de desvirtuamento da mensagem difundida, com a indução dos seus destinatários em erro.
É o que se extrai da mesma obra doutrinária de Elder Goltzman acima mencionada: “A falsidade, no contexto da desinformação, não se refere apenas a informações mentirosas ou irreais. Pode ser que o agente se valha de manipulações, contextos falsos, conteúdo fabricado ou outras estratégias (WARDLE; DERAKSHAN, 2017) para chegar ao fim de causar dano. Por isso, deve-se ter em mente que a desinformação também se vale de elementos reais. Quando alguém utiliza uma notícia verdadeira, mas antiga, como se fosse atual, para manipular quem a lê, pode-se dizer que está fazendo uso da desinformação. Há elementos verdadeiros envolvidos e pode ser que o autor da reportagem original nem mesmo saiba que ela circula como se fosse atual. Todavia, havendo intenção de prejudicar pessoas ou instituições, há desinformação. Quando uma autoridade pública concede uma entrevista e alguém, com o dolo de prejudicar, faz cortes que tiram a mensagem do contexto inicial dando uma outra ideia do discurso, há desinformação.”
A ministra finaliza a análise ressaltando o papel da Justiça Eleitoral.
“A despeito da complexidade do fenômeno, a atuação desta Justiça Eleitoral, no combate à desinformação na propaganda eleitoral – atuação a envolver, sempre, uma delicada ponderação concreta entre a preservação da liberdade qualificada de expressão no ambiente político eleitoral e a proteção da liberdade de escolha material do eleitor, sem artificiais induções em erro – deve se pautar objetivamente em um parâmetro: a vedação ao ‘compartilhamento de fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados’ (art. 9-A da Resolução 23.610 e art. 58 da Lei nº 9.504/97). É dizer: para que o conteúdo possa ser qualificado como propaganda eleitoral desinformativa, imprescindível a demonstração de que envolve fato ‘sabidamente inverídico’ ou ‘gravemente descontextualizado’, ônus que compete ao autor representante, por ser verdadeiro elemento constitutivo do direito de excepcional restrição discursiva por si buscado.”
Saiba mais sobre o tema
O autor do livro Liberdade de Expressão e Desinformação em Contextos Eleitorais, Elder Maia Goltzman, juntamente com a professora, especialista em Direito Eleitoral, Anna Paula Oliveira Mendes, autora da obra O abuso do poder no Direito Eleitoral, foram os entrevistados do podcast FÓRUM Convida desta semana.
Na conversa, os professores refletiram sobre o novo cenário eleitoral brasileiro e quais práticas se perpetuaram ao longo dos anos e que hoje se apresentam de novas maneiras. E respondem: afinal, a Justiça Eleitoral cassa muitos mandatos no Brasil? Ou, se eles são cassados, não seria pelo fato de ser realmente necessário? Perguntas recorrentes que ganham ainda mais repercussão em tempos de eleições.
No ano em que escolheremos quem ocupará os cargos de presidente, deputados estaduais e federais, além de senadores, o que não faltam são desafios para os profissionais do Direito que lidam, direta ou indiretamente, com o tema eleições.
Como os países lidam com a desinformação? E qual a jurisprudência existente Brasil afora?
O convite é para que você ouça o podcast e elabore suas conclusões.
Mais dos autores e das obras
Na nossa Loja Virtual, você encontra o livro O abuso do poder no Direito Eleitoral de Anna Paula Oliveira Mendes, que trata da necessidade de resguardar a legitimidade das eleições ao mesmo tempo que reflete sobre um arcabouço jurídico no qual acertadamente permite a cassação dos mandatários fraudulentos. É possível encontrar também a obra Liberdade de expressão e desinformação em contextos eleitorais de Elder Maia Goltzman. O livro, amparado na doutrina, especialmente nas ideias de John Stuart Mill, e na jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, contribui com uma visão geral do tema.