O jurista Daniel Ferreira, autor da obra “A licitação pública no Brasil e sua nova finalidade legal: a promoção do desenvolvimento nacional sustentável” (Editora Fórum, 2012) e de diversos estudos voltados à análise do regime jurídico das licitações e contratos, participará XI Fórum de Contratação e Gestão Pública. Daniel Ferreira, professor titular de Direito Administrativo da Faculdade de Direito de Curitiba e doutor em Direito pela PUC-SP, falou brevemente sobre “licitações sustentáveis”, um dos temas atuais que farão arte da programação do evento:
1) Qual o reflexo prático da inserção da “promoção do desenvolvimento nacional sustentável” como objetivo das licitações públicas?
O reflexo prático é a necessidade de reaprender a licitar porque a experiência anterior de nada serve. Melhor dizendo, a alteração havia no art. 3º da Lei nº 8.666/93 mudou o paradigma e não mais se presta a defender os interesses dos licitantes (isonomia) ou mesmo da Administração Pública (seleção da proposta mais vantajosa). Hoje, a licitação também deve obrigatoriamente servir para promover o desenvolvimento nacional sustentável e como terceiro fim legal. Isto é, não adianta atender os outros dois e esquecer do “terceiro” porque a licitação continuará eivada de vício que poderá ser desconstituído tanto pelo Poder Judiciário como, até mesmo, pelos Tribunais de Contas se necessário.
2) A promoção das chamadas “licitações sustentáveis” pode ser considerada dever ou faculdade da Administração?
Para nós, licitações sustentáveis são aquelas que, simultaneamente à garantia da isonomia entre os licitantes e à seleção da proposta mais vantajosa, promovem o crescimento da economia brasileira, com preocupação ambiental e de modo a permitir uma maior inclusão social. Ou seja, são aquelas que, de fato, garantem espaço reservado às microempresas e/ou protegem os bens, produtos e serviços brasileiros, apresentam deliberada preocupação com o meio ambiente e, ademais, que se atentam, por exemplo, à necessidade de apresentação da CNDT como meio de proteção dos trabalhadores.
3) Em sua visão, quais são as maiores dificuldades para a adoção de critérios de sustentabilidade nas licitações?
A principal dificuldade consiste na novidade. Na necessidade de pensar a licitação como algo novo, diferente. Na impossibilidade de continuar brincando de CTRL+C CTRL+V. Não dá mais para recortar e copiar os editais anteriores. É preciso compreender que a licitação não se confunde com seu objeto e que seu objeto não se confunde com a promoção do desenvolvimento nacional sustentável. Ou seja, é preciso capacitar, capacitar e capacitar os direta e indiretamente envolvidos com as licitações e com as contratações públicas. A segunda dificuldade por evidente se revela pelo medo, pelo medo de errar. Contudo, acredito que, num futuro próximo, seja mais fácil justificar o erro na tentativa do acerto do que tentar sustentar que a omissão (em cumprir o novo fim legal) foi a melhor forma encontrada para não errar. Para promover o desenvolvimento nacional sustentável é preciso ação e coragem sem prejuízo da cautela – por evidente.
4) A Administração está preparada para promover o desenvolvimento nacional sustentável por intermédio das contratações públicas?
Se não está, ela tem de se capacitar porquanto a não promoção do desenvolvimento nacional sustentável significa contaminá-la de morte. Explico: de nada adianta construir a melhor escola, com ampla competitividade e pela proposta mais vantajosa se ela não servir a todos os brasileiros e que nada se confundem com aqueles que dela usufruirão, os alunos, os pais e a comunidade no seu entorno. É preciso estimular o microempreendedorismo, é obrigatório exigir que a madeira seja certificada ambientalmente e que se pretenda, sem medo, alocar na minuta do contrato (e no futuro contrato) a obrigatoriedade de reserva de um percentual de vagas para egressos do sistema prisional.
Enfim, o dinheiro público tinha que ser gasto de forma regular, mediante licitação. Agora tem de ser gasto mediante licitação regularmente conduzida e que leve proveito a mais sujeitos, a todos indistintamente, de forma a colocar o Brasil no rumo certo da ecossocioeconomia.